“Um tiro de canhão sobre uma formiga”. Assim a juíza Clara Mota Pimenta, integrante do pleno do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MT), classificou uma sentença de 1ª instância que havia cassado o mandato do vereador por Sorriso (420 km de Cuiabá), Wanderley Paulo da Silva (PP), e o declarado inelegível em decorrência de suposta fraude no preenchimento de cotas de gêneros. A expressão usada pela magistrada se deve ao fato de o caso envolver uma mulher humilde, analfabeta que atua como catadora de recicláveis e chegou a ser lançada como candidata a vereadora, mas desistiu logo em seguida.
Sob entendimento de que a punição foi desproporcional, a Corte Eleitoral firmou decisão unânime para reformar a sentença e garantir a continuidade do mandato do vereador que é também o presidente do Diretório Municipal do PP em Sorriso. Os magistrados acolheram o recurso interposto por Wanderley, pelo partido e demais membros do Diretório Municipal da legenda, e derrubaram a eficácia da sentença assinada em janeiro deste ano pela juíza Paula Saide Biagi Messen Mussi Casagrande, da 43ª Zonal Eleitoral.
O relator do recurso eleitoral foi o juiz-membro Armando Biancardini Candia. Em seu voto, ele também ponderou a mulher tida como “pivô” de toda a situação que motivou o Ministério Público Eleitoral a ajuizar a Ação de Investigação Judicial Eleitoral por Abuso de Poder é humilde, catadora de recicláveis e analfabeta. Sustentou que o analfabetismo, de fato é uma questão que configura inelegibilidade, mas nesse caso é preciso haver a impugnação da candidatura dentro do prazo.
Ocorre, que no entendimento do relator e dos demais magistrados, o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap) sequer chegou a ser validado, pois a mulher desistiu de ser candidata dias depois e foi substituída dentro do prazo. “Conheço e dou provimento ao recurso eleitoral interposto pelo Partido Progressista de Sorriso para reformar a sentença e julgar improcedente e afastar a sanção de cassação do diploma e inelegibilidade de Wanderley Paulo da Silva”, votou o relator.
Nessa linha, também votaram os demais participantes da sessão do Pleno do TRE desta terça-feira (19). “Analfabetismo é condição de inelegibilidade e deve ser impugnado na ocasião do registro de candidatura, o que não ocorreu. Ela desistiu antes do Drap. Não há segurança pra se falar em conduta pendente a convencê-la de forma ilícita a se candidatar”, disse o Bruno D’Oliveira Marques.
O juiz Jackson Francisco Coleta Coutinho concordou com os colegas julgadores. “Não houve comprovação de que ela foi convencida a ser candidata para burlar a legislação eleitoral. Ela relata que foi convidada a ser candidata, mas depois desistiu”, ponderou o magistrado.
Por sua vez, a juíza Clara Mota Pimenta ponderou tratar-se de um caso complexo, mas afirmou que as peculiaridades do processo a fez reanalisar algumas questões, o que a levou a acompanhar e elogiar o voto do relator. “Há duvidas de penumbras se ela foi artificialmente convencida a ser candidata ou se foi artificialmente convencida a desistir, pois ela tem uma hipossuficiência, é analfabeta. O nível da sanção da foi um tiro de canhão numa formiga”, ponderou a magistrada.
Segundo ela, a sentença juíza da 43ª Zona eleitoral trouxe a penalidade mais dura numa situação de mínima lesividade. Por fim, enfatizou que a candidata desistiu e não participou do pleito de modo que o Drap não chegou ser formalizado.
No julgamento o advogado Flávio Caldeira Barra fez a sustentação oral em defesa do vereador cassado, pedindo que a sentença de primeira instância fosse reformada para garantir a continuidade do mandato do parlamentar. Por fim, suas ponderações foram acolhidas por todos os membros da Corte Eleitoral.
Já o Ministério Público Eleitoral, representado pelo procurador regional eleitoral, Erich Raphael Masson, manteve parecer pela cassação do vereador e não acolhimento do recurso . Ponderou que Maria de Fatima Franças Cabezas, conhecida como “Maria Pipoca”, teria sido utilizada para simular uma candidatura e entrado no Drap apenas para preencher a cota de gênero relativa aos 30% de candidaturas femininas.
Ressaltou que a mulher é analfabeta e declarou isso na fase de instrução perante a juíza. Isso, segundo o representante do MP Eleitora, “maculou” todo o Drap do partido e dos candidatos a vereador pelo PP nas eleições de 2020 no município de Sorriso. “A Procuradoria entende que o Drap é invalido desde o início e isso interfere em todos os candidatos levando ao indeferimento de todas as candidaturas”, se manifestou ele defendendo o não provimento do recurso. Contudo, o parecer foi desconsiderado pelos magistrados. Também participaram do julgamento os desembargadores Nilza Maria Pôssas de Carvalho e Carlos Alberto Alves da Rocha (presidente do TER) e o juiz Gilberto Lopes Bussiki.
O CASO
A ação foi proposta pelo Ministério Público Eleitoral e julgada procedente em 22 de janeiro deste ano pela juíza da 43ª Zonal Eleitoral, Paula Casagrande. À ocasião, a magistrada cassou o diploma obtido pelo Partido Progressista (PP), declarando nulos todos os votos atribuídos ao partido. O presidente da sigla e vereador eleito, Wanderley Paulo da Silva, foi declarado inelegível. Na sentença, a magistrada também determinou que o mandato conquistado pelo PP fosse distribuído aos demais partidos que alcançaram o quociente partidário.
A ação foi ajuizada após o Ministério Público Eleitoral verificar a ocorrência de supostas fraudes em relação à quota de gênero. Consta na inicial que o Partido Progressista registrou a candidatura de Maria de Fátima França Cabezas, conhecida como “Maria Pipoca”, apenas para cumprir a exigência de pelo menos 30% de mulheres na formação da sua lista de candidatos ao Legislativo.
Segundo o MPE, no decorrer da investigação ficou comprovado que a “candidata laranja” era analfabeta e foi usada com a promessa de que, caso fosse eleita, ganharia o suficiente para reformar a casa dela. A candidata, segundo o MP Eleitoral, recebeu aulas para aprender a fazer uma carta de próprio punho solicitando o registro. Contudo, não conseguiu redigir a carta por ser analfabeta de modo que o documento foi assinado por uma filha dela, que é especial que e frequenta a APE no município de Sorriso.
Folha Max