Com voz embargada, dona Raimunda, mãe de oito filhos, resume o medo e a angústia das famílias que vivem há anos da agricultura familiar e agora enfrentam a iminência de deixar a terra onde construíram suas vidas.
O desespero tomou conta das famílias do Assentamento Vitória, na zona rural de Sorriso, que saíram às ruas nesta quarta-feira (5) para protestar contra o cumprimento de uma ordem de despejo. A decisão judicial, que tramita há mais de duas décadas, determina a reintegração de posse da área, onde cerca de 80 famílias vivem e produzem alimentos há quase dez anos.
Entre lágrimas, dona Raimunda, de 47 anos, se tornou a voz do grupo ao relatar o drama de quem vê a vida prestes a ser arrancada do chão que cultivou. “Eu vivo desta terra. É dela que tiro o sustento dos meus filhos. Tenho plantio, gado, porco, galinhas. Se me tirarem daqui, onde vou morar? Do que vou viver?”, questionou. Ao lado dos oito filhos, ela mostrou os calos nas mãos como prova do trabalho que sustenta a família e ajuda a abastecer as feiras da cidade.
Os moradores afirmam que não têm para onde ir e pedem que a Justiça suspenda ou adie a desocupação até que uma alternativa seja apresentada. A área, de 286 hectares, é reconhecida pelo Incra como produtiva e cumpre função social, segundo laudos técnicos já enviados ao governo estadual. Mesmo assim, a Justiça manteve a decisão favorável ao espólio da antiga proprietária, Maria Sanciarulo, cujos herdeiros disputam a posse sem residir na região.
O procurador-geral do município, Alexsandro Monarim, informou que a Prefeitura de Sorriso pretende pedir mais tempo ao Judiciário para organizar o atendimento às famílias. “Nosso objetivo é garantir que, se o cumprimento da ordem for inevitável, haja um planejamento digno e humano para essas pessoas”, afirmou.
Apesar do apelo, a juíza Emanuelle Navarro Mano confirmou que a decisão é definitiva e já foi validada pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso. O estudo operacional da Polícia Militar foi concluído, e o despejo pode ocorrer a qualquer momento. “Decisão judicial não é questão de concordância, mas de cumprimento”, declarou a magistrada.
Enquanto aguardam o desfecho, as famílias continuam cultivando a terra que chamam de lar. “A gente só quer continuar plantando e criando nossos filhos em paz”, disse dona Raimunda, com a voz trêmula e o olhar perdido no horizonte. “Essa terra é a nossa vida.”

